Foi descoberto que a ayahuasca afeta os receptores de serotonina no córtex infralímbico do cérebro, onde o medo é regulado.

Um estudo publicado no British Journal of Pharmacology no mês passado explorou como a ayahuasca (abreviada para AYA para uso neste estudo) e o DMT interagem com os receptores de serotonina na parte do cérebro que regula o medo.

Os autores explicaram que a ayahuasca foi considerada útil no tratamento de depressão, traumas e transtornos por uso de drogas em humanos, mas poucas pesquisas foram realizadas sobre como a ayahuasca afeta partes específicas do cérebro. Os pesquisadores procuraram especificamente examinar os efeitos da ayahuasca nas memórias aversivas ou negativas.

Especificamente, o estudo mostra evidências de que a ayahuasca afeta a extinção da memória do medo. Embora todos os seres vivos desenvolvam uma resposta a uma situação estressante ou induzida pelo medo, a extinção da memória do medo ocorre quando a resposta do sujeito a um estímulo recorrente diminui ao longo do tempo.

O autor do estudo, Leandro Jose Bertoglio, professor de farmacologia da Universidade Federal de Santa Catarina, disse ao portal Psy Post sobre a abordagem do estudo.

“Nosso laboratório de roedores investiga o cérebro e os mecanismos moleculares subjacentes à formação da memória durante experiências ameaçadoras ou estressantes. Nós nos concentramos no desenvolvimento de abordagens farmacológicas para enfraquecer a expressão de memórias aversivas”, disse Bertoglio. “Colaboradores da nossa rede estão estudando a ayahuasca, uma bebida popular no Brasil e na Amazônia, por seu potencial no tratamento da depressão e da dependência do álcool. Dada a nossa experiência na extinção do medo – o processo em que uma memória neutra suprime uma memória aversiva – estamos explorando o impacto da ayahuasca neste processo. A extinção provavelmente constitui a base biológica para algumas psicoterapias”.

O estudo incluiu 331 ratos Wistar, que comumente apresentam comportamento de congelamento em resposta ao medo. Os pesquisadores aplicaram um procedimento de condição de medo duas vezes por dia, o que causaria o congelamento dos ratos, e registraram a quantidade de tempo que eles congelaram para determinar a extinção do medo. Com o tempo, eles forneceram níveis variados de ayahuasca aos ratos.

Os efeitos da ayahuasca foram consistentes tanto em ratos com memórias de 1 dia, quanto naqueles com memórias de 21 dias, do condicionamento do medo. Os resultados mostram que todos esses ratos exibiram alguma forma de extinção do medo, mesmo quando foram administradas diferentes doses de ayahuasca.

Os investigadores explicaram que os receptores de serotonina (5-HT2A e 5-HT1A) na parte do cérebro que gere o medo, o córtex infralímbico, estavam sendo ativados durante o uso da ayahuasca, afetando assim a extinção do medo. “A ayahuasca administrada por via oral acelera a extinção do medo e sua retenção em ratos fêmeas e machos”, continuou Bertoglio. “Esse efeito está associado à N,N-dimetiltriptamina (DMT) e envolve a ativação de dois subtipos de receptores de serotonina (5-HT1A e 5-HT2A) no córtex infralímbico. Esta região do cérebro, homóloga ao córtex pré-frontal ventromedial em humanos, é crucial na regulação da extinção da memória”.

Existem muitos estudos que mostram evidências da interação do receptor 5-HT2A com o uso de substâncias psicodélicas, mas há menos conhecimento sobre o receptor 5-HT1A e como ele interage com os psicodélicos. “Comparado ao receptor 5-HT2A, a participação do receptor 5-HT1A nos efeitos da ayahuasca e de outros psicodélicos serotoninérgicos clássicos (por exemplo, psilocibina e LSD) tem sido menos explorada”, explicou Bertoglio. “Nossa pesquisa teve como objetivo elucidar o papel de ambos os receptores, demonstrando que a ação do DMT nos receptores 5-HT1A e 5-HT2A contribui para aumentar a extinção do medo”.

Os pesquisadores concluíram que a ayahuasca facilita a “supressão comportamental de memórias aversivas no córtex infralímbico do rato”, o que também sugere que tanto a ayahuasca quanto o DMT poderiam ser usados ​​para tratar distúrbios específicos relacionados ao estresse.

De acordo com Bertoglio, esta pesquisa abrirá portas para mais oportunidades no futuro para explorar como os psicodélicos podem afetar memórias de medo de longo prazo, como aquelas sofridas por pacientes com transtorno de estresse pós-traumático. “Nosso objetivo é avançar na compreensão de como e onde as substâncias psicodélicas atuam na modulação da expressão e persistência de memórias aversivas”, concluiu Bertoglio. “Esses estudos promovem colaborações e suas descobertas incentivam estudos relacionados com humanos”.

Relatos pessoais de pacientes que buscaram experiências de tratamento com ayahuasca falaram sobre os benefícios que receberam. O boxeador peso-pesado e medalhista olímpico, Deontay Wilder, falou recentemente em dezembro de 2023 sobre como “renasceu” depois de experimentar o tratamento com ayahuasca na Costa Rica. “Ah, cara, a ayahuasca tem sido uma das coisas mais importantes da minha vida, estou feliz por ter experimentado”, disse Wilder. “Uma das melhores jornadas para vivenciar, tem sido uma coisa linda para mim e se você perguntar à minha esposa, ela dirá que isso me deixou mais sensível, e ela provavelmente está certa, mas também me deixou mais feliz”.

Outras substâncias psicodélicas também estão sendo elogiadas por proporcionarem benefícios únicos aos pacientes, e a opinião pública sobre os psicodélicos está rapidamente a tornar-se dominante. Um estudo recente publicado no American Journal of Bioethics Neuroscience esta semana descobriu que nove em cada 10 estadunidenses aprovam que a psilocibina seja administrada em um ambiente controlado com a intenção de tratar condições específicas.

Outro estudo recente publicado na Neuroscience Applied mostra que a psilocibina pode realmente reduzir a resposta de uma pessoa a “expressões faciais de raiva”. Os pesquisadores examinaram a amígdala, parte do cérebro que regula as emoções. “Descobrimos que a resposta da amígdala a rostos zangados foi significativamente reduzida durante a exposição à psilocibina em comparação com a linha de base, enquanto não foram observadas alterações significativas nas respostas da amígdala a rostos medrosos ou neutros”, escreveram os autores.

Referência de texto: High Times

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